quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Vermelho

Cinza.
Minha primeira visão.
Tons de cinza e branco.
Cinza? O céu. Nublado.
Pisco algumas vezes. Umidade. Frio. Cinza.
Me levanto lentamente. Água. Em todo lugar.
E mais cinza.
Dessa vez, blocos enormes de concreto cinza. Prédios.
Mais água.
Algo frio toca minha mão. Olho para ela. Uma caneca rosa, com as bordas enferrujadas.
Vermelho, tecido. Alguns ferros. Olho ao meu redor. Desconforto. Não era um barco. Mas estava flutuando. Sinto o movimento da correnteza.
Me apoio nos braços, e sinto a umidade entrar pelas minhas costas. Vejo o ferro projetando-se do meio de meu modo de locomoção.
Estava dentro de um guarda-chuva. Flutuando.
Meus olhos se movimentam rápido, e minha consciência não está completamente ativa para acompanhá-los. Fecho-os por alguns segundos. Respiro. Abro-os novamente. Tento raciocinar e entender a cena.
Uma cidade alagada, no qual se vê apenas parte dos prédios. Eu estava em um guarda chuva vermelho, com uma caneca dentro. Olho ao meu redor. Alguém? Avisto alguns barcos, com pequenas lanternas penduradas e pessoas aglomeradas em seus interiores. Pequenas ilhas neste caos úmido.
Fecho os olhos mais uma vez. Respiro.
Me ajeito mais para o meio do guarda-chuva, para a água parar de entrar. Entendo a ultilidade da caneca, e começo a enchê-la para me livrar do líquido que mantinha meu guarda-chuva ainda mais afundado.
Estou com frio, e meus dentes tilintam. Meus osso doem e gelam. Meu corpo está entorpecido pela camada gelada, a água, que queima de tão fria.
Usando um pouco de força, ofegante e em desespero, grito para um dos barqueiros, mas eles me ignoram. Seus barcos já estavam lotados.
Olho ao meu redor novamente, em busca de um lugar para parar, ou alguém para me socorrer. Entro em pânico. Me sinto fraca. Poderia morrer em meio aos golpes líquidos. Poderia me render ao frio.
É quando sinto a maré mudar, e as águas ficam mais agitadas.
Então o vejo. Dobrando a esquina desse mar no concreto, vem outro barco. Mas dessa vez muito maior que os outros.
Ele é todo iluminado, por pequenas lampadas ao seu redor, que o contorna sutilmente, e sua parte de cima é aberta. Aparentemente é movido a motor, pois de sua parte traseira, saem bolhas, que agitam tanto a maré. Seu cascalho era vinho desbotado, e em preto se lia o nome: 'Pala's Sword'
Segurando no mastro e olhando para os lados, eu via a figura de um menino. Seus cabelos escuros rebeldes agitavam com o vento forte, e seus olhos estavam estreitos.
Arregalo os olhos diante da imagem, e desisto de tirar a àgua do guarda-chuva - o movimento do barco fez com que ele praticamente inundasse, e eu já estava completamente molhada.
Junto as forças, e lutando para não afogar, grito por socorro.
O menino olha pra mim, e sinto ele me notar.
Então, depois de entender a cena, ele grita algo inaudível entre o som da maré, e vejo alguns homens se aproximarem.
Juntos, arremessam uma corda na àgua, com uma bóia branca presa na extremidade, e ela cai próxima ao meu guarda chuva.
Lutando e movimentando meus braços para me aproximar da bóia, seguro ela com uma mão, mas não saio do guarda-chuva. Tomo cuidado para me assegurar que estou segurando a ambos fortemente, apesar de meu corpo doer com o frio, que parece drenar meu sangue até me sentir vazia, e minhas mãos arderem pelo contato com o ferro do guarda-chuva.
Sinto que eles começam a me puxar, mas minhas forças estão se esvaindo. Fecho os olhos. "Apenas mais alguns metros, apenas mais alguns metros."
Meus dentes tilintam, meu aperto afrouxa, meus olhos lutam contra a escuridão.
"Mais alguns metros."
O frio invade meu cérebro, e abaixo minha cabeça. Sinto meu braço se soltar da bóia.
"Mais..."
Estou quase me rendendo quando sinto algo quente e macio tocar meu braço.
Em um ultimo esforço, entreabro meus olhos.
-Bem Vinda ao Pala's Sword. Você está à salvo agora.
Minha ultima visão foi o mar verde.
Mas o mar verde eram os olhos do menino.
Tudo escurece, e me rendo ao desmaio.

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